Doutor em engenharia química, bacharel em física, Gilberto Campello Brasil tinha duas paixões na vida: os peixes e os cactos.
Por Marcelo Notare – Eu conheci o pesquisador e aquarista Gilberto Campello Brasil no final dos anos 80, quando passamos a editar e publicar a Revista de Aquariofilia na editora Mergulhar (bairro de Botafogo, Rio de Janeiro). Em sua residência, em São Paulo, onde havia tanques e aquários, eu vi, pela primeira vez, alguns peixes e plantas aquáticas muito raros, inclusive a planta Bolbitis heudelotii (Bory et Fée) Alston, uma pteridófita aquática africana, quase desconhecida dos aquaristas, que ele trouxe do Jardim Botânico de Kew, na Inglaterra. Havia também muitos killifishes novos que ele descobriu e coletou viajando por todo o Brasil. Além de plantas carnívoras, como Heliamphora parva var. neblinae, que ele trouxe quando subiu o Maciço da Neblina (AM), na fronteira com a Venezuela.
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Revista de Aquariofilia nº5 com a primeira reportagem de Gilberto Campello Brasil no Sudeste da Ásia em busca de plantas aquáticas. (Créditos/reprodução: Marcelo Notare)
Na época, Gilberto Campello Brasil vivia sozinho numa casa na Rua Turiassú, no bairro Barra Funda, na capital. O entusiasmo dele por peixes e plantas era contagiante… o cara era fissurado. A editora Mergulhar dispunha de escritórios e boas instalações na Avenida Paulista e Brigadeiro Faria Lima, mas preferíamos ficar hospedados na sua residência, bebendo cerveja dia e noite diante de um imenso e detalhado mapa do Brasil, a fim de planejar as próximas viagens dele e dos nossos amigos em busca de raridades da natureza. Algumas dessas viagens se tornaram ótimas reportagens publicadas na Revista de Aquariofilia e, posteriormente, na revista HABITAT. Há muitos anos – eu quero destacar – Gilberto Campello Brasil era reconhecido internacionalmente por suas descobertas e publicações em diversos periódicos técnicos e científicos estrangeiros sobre Biologia aquática.
Desaparecimento
Há quase oito anos, Gilberto Campello Brasil desapareceu, misteriosamente. No dia sete de novembro de 2008, um sábado à noite, ele foi visto pelo vizinho saindo de casa para não mais voltar. Até hoje, ninguém sabe de seu paradeiro. A polícia fez investigações e descobriu que ele havia parado num posto de gasolina, abasteceu seu carro, tirou dinheiro em um caixa eletrônico e tomou rumo ignorado. Estava sozinho, como sempre. O meu amigo ictiólogo Wilson Costa, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, me disse que, apesar das investigações, não houve qualquer indício sobre o seu destino e que Gilberto Campello Brasil foi considerado oficialmente morto. Houve boatos de que o seu corpo foi encontrado, apenas boatos.
Legado
O que restou de seu acervo, incluindo ovos de peixes anuais, plantas e livros, foi doado pelo seu primo ao Jardim Botânico de Brasília. Gilberto Campello Brasil foi graduado em Física e em Engenharia Química (área na qual tinha doutorado e pós-doutorado). Trabalhou no desenvolvimento de processos industriais e, mais recentemente, no estudo de impacto ambiental de atividades antrópicas diversas. Foi consultor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e assessor técnico do Ministério do Meio Ambiente. Dedicou-se à aquariofilia desde 1954, e, em particular, desde 1970, aos peixes anuais brasileiros, tendo descoberto diversas espécies novas.
Homenagem
Um gênero de peixes aploqueilóideos foi designado em sua homenagem: Campellolebias (Vaz-Ferreira & Sierra, 1974). A espécie-tipo, Campellolebias brucei Vaz-Ferreira & Sierra, foi por ele descoberta em poças temporárias perto do município de Criciúma (SC).
Gilberto Campello Brasil, o seu trabalho foi Grande. Obrigado por Tudo.